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gestão médica: de onde viemos, para onde vamos

                                         GESTÃO MÉDICA: DE ONDE VIEMOS, PARA ONDE VAMOS


                                                                                   Por: Márcia Campiolo


Resumo da palestra apresentada por Márcia R. F. Campiolo no encerramento do Simpósio Allergan do  durante o XXXIV Congresso Brasileiro de Oftalmologia, ocorrido em Brasília no mês de setembro/07.


A oftalmologia é uma especialidade médica cuja elevada competividade de mercado, assim como as constantes necessidades de investimentos na atualização profissional e em tecnologia, fazem da Gestão dos consultórios uma área de elevada importância para as chances de sucesso destes profissionais.


Para que nós posamos entender um pouco melhor o que está acontecendo com o mercado médico hoje, principalmente no que se refere ao perfil de cliente que estamos recebemos diariamente nas clínicas, nós precisamos retroceder no tempo. O entendimento do passado nos possibilita a obtenção de uma melhor compreensão do presente, ampliação da visão de mercado futuro, assim como do delineamento mais claro das melhores estratégias diante da alta complexidade do mercado.


Como disse Karl Marx, filósofo alemão que morreu em 1883:


“Os homens fazem a sua própria história, mas não a fazem como querem; não a fazem sob circunstâncias de sua escolha e sim sob aquelas com que se defrontam diretamente, legadas e transmitidas pelo passado.”


Os fatos marcantes que construíram a história do mercado médico e seus clientes que hoje se configura são muitos, que em meu livro “Gestão do Consultório Médico, faço uma análise mais extensa,  mas vamos citar apenas alguns  deles que são interessantes e sinalizadores dos caminhos percorridos :



  • Na época do rei Hamurabi DA BABILÔNIA (SEC 18 AC), foi escrito o chamado “Código de Hamurabi”, constituído de leis para tratar de assuntos relacionados a diversos assuntos referente a vida dos cidadãos, inclusive obrigações de profissionais liberais como os cirurgiões. As penas, envolviam com frequência mutilições corporais. Em alguns de seus artigos, nós podemos identificar referências a um “ancestral do oftalmologista atual” . Um dos artigos diz, que se o médico, ao abrir uma incisão no olho de uma pessoa(homem livre), levasse esta pessoa a perder o olho, a pena seria a decepação da mão deste médico.  


Este código pode ser considerado o primeiro código de defesa do consumidor que se tem registro.


·         Em 1962, no dia 15 de março, John Fritzgerald Kennedy enviou ao Congresso americano uma carta onde pedia aos congressistas que as leis passassem a ter uma atenção especial no que se refere aos direitos do consumidor, relacionados a quatro aspectos: Direito à Segurança ou proteção contra a comercialização dos produtos perigosos à saúde e à vida; o direito à informação, em que se incluem os aspectos gerais da propaganda e a necessidade das informações sobre o próprio produto e sua melhor utilização; o direito à opção, dando combate aos monopólios e às leis antitrustes e considerando a concorrência e a competitividade como fatores favoráveis ao consumidor; o direito a ser ouvido, que passou a considerar os interesses dos consumidores na hora de elaborar políticas governamentais e de procedimentos de regulamentação. Atualmente, o dia 15 de março é comemorado como o Dia Mundial dos Direitos do Consumidor.


·         Em setembro de 1990, no Brasil, foi aprovado o código de defesa do consumidor-CDC que também criou o Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor, da Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça. Foi um marco no sentido de propiciar rápidas transformações do mercado de clientes. A partir da aprovação deste código, iniciou-se um processo de aceleração na formação de uma consciência mais efetiva dos brasileiros no sentido de exigir com mais firmeza seus direitos, reclamar daquilo que não se concorda, do que não satisfaz do que não é como se esperava. O maior impacto não foi jurídico, mas social: o cliente conscientizando-se de seus direitos



  • No Brasil, somente a partir de 1995, os usuários, fora das instituições de pesquisa ou educacionais, começaram a ter a oportunidade para o uso da internet, através da abertura para o setor privado para a sua exploração comercial. Este fato vem revolucionando e democratizando cada vez mais a comunicação e a circulação de informações.


Podemos observar claramente pelo curso da história, que os acontecimentos caminham firmemente no sentido de termos em nossa sociedade indivíduos informados, exigentes, críticos, cientes de seus direitos, com uma maior preocupação com o ambiente e com questões sociais.


Além dos fatores acima citados, precisamos salientar que no Brasil, estamos assistindo a um crescimento acelerado e desordenado no número de faculdades de medicina que passaram a colocar no mercado a cada ano uma quantidade muito grande de novos profissionais ávidos por se estabelecerem e firmarem-se profissionalmente.


Segundo matéria publicada no Jornal o Estado de São Paulo em 13/06/2007;


“A quantidade de faculdades de Medicina no Brasil só é menor do que na Índia. Até 2002, elas eram 115. Hoje chegam a 167(disponibilizam 17.836 vagas todos os anos ). Os dados são de levantamento apresentado pela Associação Médica Brasileira (AMB), durante o 11º Encontro Nacional das Entidades Médicas (Enem), em Brasília”.


No dia 02/06/1999, a Revista Veja publicou uma matéria intitulada “A dura rotina de branco” em que demonstrava já naquela época o problema do elevado número de profissionais no mercado. Em um trecho da matéria, a revista cita:


“Existem no país 220.000 médicos, um para cada 700 habitantes. É uma relação bem maior do que a recomendada pela Organização Mundial de Saúde, de um para cada 1.000 habitantes. Para piorar, 60% dos profissionais se concentram na Região Sudeste”.


O IBGE estimou para 2006 que o Brasil contava com 186.770.562 habitantes, o que demonstra, segundo o número de médicos ativos no país, uma relação de 1 médico para 583 habitantes (Fonte: Revista Jota Zero jul/ago/07).


No ano de 2001, o Conselho Brasileiro de Oftalmologia-CBO publicou os resultados um censo em que foi realizada uma detalhada radiografia da Oftalmologia no Brasil. A pesar de ter sido realizada já há alguns anos, seus dados são ainda muito concretos e importantes para a compreensão do mercado oftalmológico brasileiro. Ele mostra, sem sombra de dúvidas, que o mercado caminha rapidamente para uma situação bastante delicada no que diz respeito ao número de profissionais, assim como sua distribuição pelo país.


Cabe aqui, citar alguns destes dados:

O Brasil, tem a segunda maior comunidade de oftalmologistas do mundo.


98,14% encontram-se em cidades com mais de 50.000 habitantes.


Dos 170 milhões de habitantes calcula-se que apenas 40 milhões podem pagar   convênio ou particular (23,5%).


Em 12 anos o número de Oftalmologistas terá dobrado e a população terá crescido 17%.


Abaixo, podemos observar uma projeção gráfica deste crescimento.


 


Além disso, o CBO-Conselho Brasileiro de Oftalmologia considera que a relação de um oftalmologista para cada 17.000 habitantes é bastante equilibrada, mas, mesmo em 2001, estes números já estavam críticos e muito longe do ideal em várias cidades brasileiras, sejam elas capitais ou cidades do interior. Podemos constatar isto no quadro abaixo que cita apenas algumas capitais


Fonte: Censo CBO 2001


O mundo, as profissões, a medicina e consequentemente, a oftalmologia, vive hoje um momento sem precedentes no que se refere a competitividade de mercado, que tem em seu encalço um número muito grande de fatores complicadores, velhos conhecidos da oftalmologia e que não se resumem somente na questão do elevado número de médicos oftalmologistas de mercado.


As, mudanças de mercado e no perfil do comportamento cliente passou a exigir preparo e investimento cada vez maior do médico e sua equipe, no que se refere à aquisição e atualização de conhecimentos, tecnologia, qualidade no atendimento, conforto e comodidades do espaço físico para atendimento, qualidade e confiabilidade dos serviços médicos prestados, assim como elevado nível de informação ao cliente.


Assim, podemos concluir que o médico, além de exercer uma medicina competente atualizada e ética, deverá também ser o líder do funcionamento da clínica, deverá ser um gestor competente de sua carreira, de seu consultório.


Neste momento eu pergunto aos profissionais médicos:


Vocês estão preparados para atuarem com sucesso no mundo atual diante destas duras condições de mercado?


Cabe aqui citar a frase de Albert Einstein:


“No meio de qualquer dificuldade encontra-se a oportunidade”.


As dificuldades de mercado devem e podem ser superadas através de um maior preparo dos profissionais para enfrentarem estas condições, principalmente através de um maior investimento no preparo para gerir a sua clínica. Esta não é uma tarefa fácil, mas não impossível, por isto, a busca de conhecimentos que levem a eficácia neste setor é certamente uma alternativa viável e necessária.


Infelizmente o que podemos observar no mercado em grande número, é uma ausência de preparo alarmante no que se refere as formas de gestão adotadas pelos profissionais médicos nas diversas especialidades.


A formação médica, ao longo do tempo, tem tido o seu foco exclusivamente no conhecimento médico. Assim, nós assistimos os novos profissionais que chegam ao mercado, ávidos para iniciarem seu trabalho, em muitos casos montando seus consultórios, se depararem com um desafio imenso: a necessidade de uma engrenagem ao seu redor que se movimente competentemente, para que ela possa exercer o seu papel de médico e tenha maiores chances de alcançar o sucesso profissional.


Esta estrutura que é fundamental para o trabalho do médico, pode ser resumidamente citada nos itens abaixo:



  1. ESTRUTURA FÍSICA,

  2. RECURSOS HUMANOS,

  3. DELINEAMENTO DOS PROCESSOS DE ATENDIMENTO

  4. FATURAMENTO

  5. DOCUMENTOS LEGAIS COM LICENÇAS DE FUNCIONAMENTO ATUALIZADAS

  6. CONTRATOS COM CONVÊNIOS,

  7. PARTICIPAÇÃO EM COOPERATIVAS E OUTRAS ENTIDADES MÉDICAS,

  8. CONHECIMENTO JURÍDICO

    1. CÓDIGOS ÉTICA MÉDICA,

    2. CÓDIGO CÍVIL,

    3. CÓDIGO PENAL,

    4. CÓDIGO DE PROTEÇÃO E DEFESA DO CONSUMIDOR),

    5. CLT

    6. outros



  9. CONTAS A PAGAR

  10. CONTAS A RECEBER

  11. BANCOS,

  12. INVESTIMENTOS,

  13. CUSTOS.

  14. FORNECEDORES


Aliado a estes fatores, ele terá diante dele, um cliente que quer informação, explicação, solução, sem possibilidade de erro, porque o médico tem na sociedade uma elevadíssima cobrança por perfeição em seu trabalho. A sociedade, os cidadãos e seus mecanismos sociais, como a imprensa costumam ser impiedosos com este profissional.


Existe uma carência imensa de informações e preparo dos profissionais nesta área, o que acaba levando a situações, relacionadas a gestão das clínicas, onde o médico acaba por “migrar”para extremos:



  1. Na ânsia de dominar a situação, concentra excessivamente o andamento dos trabalhos e decisões na sua figura, fazendo muitas vezes até pequenos serviços burocráticos que poderiam facilmente ser delegados a um colaborador de sua equipe. Equipe esta que pode ser de apenas um funcionário, ou quantos outros existirem na estrutura.

  2. Delega excessivamente a execução de trabalhos e decisões, sobre a sua equipe . Assim, ele acaba ficando numa “zona de conforto”, onde tem a falsa idéia de segurança e estabilidade. O gestor é muitas vezes a secretária, sobre o qual foi delegado os poderes de “dono do clínica”


Em ambos os casos, estes extremos não se constituem no melhor caminho a ser trilhado na área de Gestão médica. Corrigir estas distorções, levanta dentro de nós uma missão desafiante e imensa.


A mola propulsora para isto, o segredo do sucesso, certamente está na visão que o médico tem de sua profissão e do mercado. As chances de sucesso são proporcionamente ligadas a isto. O médico Paul-Ferdinad Gachet. conviveu com Van Gogh(1890) durante os últimos meses de vida do pintor e foi o único a aceitar seus quadros como pagamentos das consultas. Ele provavelmente enxergou lá, uma oportunidade que os outros não viram.


Considerando o que foi dito até agora, podemos tentar enxergar um pouco das exigências que o futuro nos reserva o que não é tão difícil. O futuro tem suas setas apontadas na direção de vários pontos, mas posso dizer que o fator informação voltada para a educação do cliente da área médica, certamente é um dos elementos chave para onde estamos sendo fortemente direcionados.


As pessoas querem e vão querer cada vez mais informações sobre o seu “caso”. Esta é a mola propulsora da sociedade atual e será cada vez mais fortalecida no futuro, ou seja, a informação é a face do presente e do futuro na área médica.


A Revista Época do dia 20/08/2007, trás em sua matéria de capa uma reportagem entitulada “Doutor Google” e pode-se ver claramente nesta matéria que a busca por informações, por parte dos pacientes, é a tônica do momento na rota das transformações na relação médico paciente, e que para o indivíduo, o conhecimento é tão importante quanto médicos, tecnologia, remédios, hospitais e terapias.


É possível observar o grande número de clínicas médicas onde não existe trabalhos focados com elevado nível de informação educacional  de qualidade e apropriada aos clientes atendidos, mas precisamos pensar seriamente sobre esta questão, nos sintonizarmos com as mudanças de mercado, assim como com os desejos da sociedade.


O quadro “A incredulidade de São Tomé”de Caravaggio é uma imagem que possui uma força muito grande. Nós podemos tirar dele uma mensagem importante, que nos mostra que muitas vezes não é necessário que coloquemos o dedo dentro da ferida para que possamos enxergar o que está acontecendo. As pistas podem ser percebidas e interpretadas através de vários sinais que se apresentam diante de nós, basta que para isto haja vontade e visão mais ampla.


Se como pitágoras disse “As palavras são os suspiros da alma” esta minha reflexão sobre a gestão nesta área tão nobre como é a medicina, com certeza foi um agradável e profundo suspiro de minha alma. Muito obrigada!
 

 


Todos os artigos são de autoria de Márcia Campiolo e não podem ser alterados ou republicados sem a permissão da autora.

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